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Mirna Tonus: "A aplicação da pesquisa não morre com o fim do projeto"

Atualizado: 30 de set. de 2022


Por Isabella Alvarenga


A professora e pesquisadora da graduação e pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Mirna Tonus, foi a escolhida para abrir a seção de entrevistas do Observatório da Pesquisa Aplicada. Atuante na área há 33 anos, ela acumula experiência em produção acadêmica e liderança em diversas instituições. Seu trabalho tem sido dedicado também às pesquisas aplicadas em Jornalismo.


Mirna Tonus é bacharel em Jornalismo, mestre em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba, doutora em Multimeios pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pós-doutora em Sociologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ela também é diretora Sudeste da Associação Brasileira de Ensino de Jornalismo (ABEJ) e coordenadora do Expocom, categoria Jornalismo.


Na entrevista, a professora fala sobre as dificuldades de se fazer pesquisa aplicada em jornalismo no Brasil e defende a redução da distância entre teoria e prática e entre universidades e mercado de trabalho.


Isabella Alvarenga - Existe uma dificuldade para se entender o que é pesquisa aplicada em jornalismo?


Mirna Tonus - Eu acho que sim. Ainda não se chegou a uma definição sobre o que é pesquisa aplicada em jornalismo. Embora tenha autores que falem sobre a metodologia da pesquisa aplicada, ainda sim é difícil dizer exatamente o que é.


IA - Para você, o que é pesquisa aplicada em jornalismo ?

MT - Na minha visão, esse tipo de pesquisa precisa ter "mão na massa", precisa ter o envolvimento do pesquisador e não é só a questão da pesquisa participante por exemplo em que participo de algum projeto e relato o que fiz. É aplicar algo para modificar a realidade e, a partir disso, fazer trabalhos teóricos que vão discutir a mudança realizada. Eu entendo que a pesquisa aplicada tem esse caráter de produção.

Integrante do grupo OPAJor ( Isabella Alvarenga) e Mirna Tonus em Patos de Minas/MG.

IA - Um projeto com foco em pesquisa aplicada só é válido quando se é continuado?


MT - Acredito que não. Um projeto de pesquisa aplicada não precisa ser necessariamente eterno. A partir do momento em que o trabalho é desenvolvido, mesmo que não continuado, modifica a realidade. Ele não vai ser a mesma para futuros pesquisadores. Digamos que eu trabalhe com dados de jornalismo ou mídias sociais e jornalismo. Se eu desenvolvo alguma ferramenta para estudar ou filtrar dados, eu posso fazer o relato da minha pesquisa e isso ser utilizado por outras pessoas e ter até mesmo outras aplicações. A aplicação da pesquisa não morre com o fim do projeto.


IA - Em um estudo recente feito pelo nosso grupo, notamos baixa adesão à pesquisa aplicada em programas de pós-graduação da área de jornalismo. Gostaríamos de saber se esse cenário de poucos trabalhos em pesquisa aplicada também é visto por você.


MT - Sim, eu acredito que exista muito receio em mudar a realidade. Além disso, a pesquisa aplicada é muito trabalhosa. Você tem que interagir com outras áreas de conhecimento e precisa ter planejamento antes de executar. Outro ponto é que a pesquisa aplicada demanda muito tempo e o aluno pode não conseguir desenvolver um projeto aplicado no período que ele tem disponível em um mestrado. Porém, se pensarmos em um doutorado que leva 4 anos para ser desenvolvido, é mais difícil dizer o que causa esse desinteresse por pesquisa aplicada.


"É preciso se juntar a grupos focados em pesquisa aplicada para conseguir ter o espaço para produzir trabalhos aplicados"

IA - Quais outras dificuldades a pesquisa aplicada em jornalismo enfrenta aqui, no Brasil?


MT - Falta de recursos financeiros, porque, dependendo da aplicação da pesquisa, precisa de um investimento que não tem. Acredito também que é mais sobre a falta de divulgação de pesquisa aplicada do que a não realização de trabalhos dessa natureza. Como por exemplo, grupos de pesquisa experimental que desenvolvem ações para área de jornalismo, mas que não se tem a mensuração ou a reflexão do que foi realizado após a sua aplicação e, por conta disso, o que foi feito se perde.


IA - Atualmente é possível notar um aumento do interesse em pesquisa aplicada ?


MT - Existem grupos muito interessados na área como a Rede JorTec. É preciso se juntar a grupos focados em pesquisa aplicada para conseguir ter o espaço para produzir trabalhos aplicados.

"...nós temos que desenvolver pesquisas para modificar o mercado e para contribuir com ele"

IA - Como você enxerga a distância entre a teoria e a prática jornalística? E entre universidades e mercado de trabalho ?


MT - Eu acredito que ela exista, mas está diminuindo, ao menos nos cursos em que eu participo, existe uma preocupação constante em reduzir esse estado. Sobre universidades e mercado de trabalho, existem críticas no sentido de que: “não vou produzir o que o mercado quer”. E não é sobre isso, mesmo! Não temos que fazer o que o mercado quer, nós temos que desenvolver pesquisas para modificar o mercado e para contribuir com ele. Neste sentido, eu não vejo motivos para existir distanciamento. Se eu aproximo com o intuito de identificar um problema no mercado, pesquisar e ajudar resolver, por quê não fazer? A universidade não deve produzir conhecimento para ficar encastelado, deve existir diálogo com o mercado de trabalho.


IA - Existe algum tabu/preconceito em torno da pesquisa aplicada ?


MT - Não é preconceito, mas existe uma certa resistência. Às vezes eu me deparo com algumas discussões que olham torto para o caráter mercadológico da pesquisa aplicada. Se existe um grupo que diz: “não vou dialogar com o mercado e vou fazer minha pesquisa independentemente do mundo”, dificilmente esse grupo vai entender a necessidade de aproximação com o mercado em uma pesquisa.


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